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Depois de passarmos para o outro lado, haverá volta atrás?

  • Foto do escritor: E. Gonçalves
    E. Gonçalves
  • 31 de ago. de 2024
  • 3 min de leitura

Durante a minha vida, ouvi muitas vezes a frase: "depois que se passa para o outro lado, não há volta atrás." Mas será que realmente não há? Talvez essa frase seja mencionada apenas em situações onde realmente não há retorno, ou seja, no momento em que tomamos uma decisão. Após uma escolha, de facto, não há como voltar atrás, apenas as consequências dela, sejam elas boas ou más. No entanto, mesmo que "não haja volta atrás" no sentido de não podermos voltar no tempo, ainda podemos recuperar nossos princípios, aqueles que tínhamos antes de cruzar essa linha, esse limite.


Se usarmos o exemplo de uma pessoa que se droga:
Joaquim era um bom rapaz. Como todos os seres humanos, ele teve que enfrentar uma prova difícil de nível emocional: perdeu os pais num acidente. Como superar a dor? Sobretudo quando as pessoas com quem mais desabafava já não fazem parte da sua vida, já não estão neste mundo. Joaquim encontrou um grupo de amigos que o ajudou a superar esta fase, mas com a ajuda da droga. Era fácil: ele esquecia e sentia-se livre de problemas quando usava aquela substância. Dizemos que foi um azarado, no “nosso mundo”. Um rapaz que poderia ter ido longe, mas uma desgraça caiu sobre ele, e, para se livrar dos problemas, meteu-se onde não se devia. Mas, como podemos imaginar, os problemas, os sentimentos e a dor não desaparecem quando não lidamos com eles de forma adequada. Então, ele decidiu cruzar a linha, ir para o outro lado, um lado mais pesado, de onde ele não poderia voltar atrás...

Estou a usar esta história como exemplo pela facilidade de visualização do meu dilema. Sinceramente, eu tenho os meus demônios e um grande defeito: torno-me mentirosa quando tenho medo de enfrentar as pessoas, e cada vez mais dou-me conta disso. Cada vez mais tenho consciência disso.

Quando não quero sair, minto. Quando não quero ir a uma festa de noivado ou a um casamento, arranjo uma desculpa de última hora. Justificativas graves, das quais tenho vergonha de mencionar aqui. Um dia, os céus vão me castigar por todas as mentiras que conto, que inventei por medo de enfrentar a realidade: tenho medo de dececionar as pessoas ao meu redor, tenho medo de magoá-las, tenho receio do que vão pensar de mim. Não é algo nobre; é covarde. Está na hora de chamar as coisas pelos nomes.

É ridículo o quão ansiosa (sentimento negativo) fiquei com a possibilidade de receber uma proposta de trabalho em um lugar onde não aprecio. A minha mente entrou em parafuso, pois mil e um pensamentos invadiram o meu ser:


"Devias ter vergonha, tanta gente a precisar de trabalho e tu com ideias de recusar um lugar só porque não te sentes bem."
"Em todos os trabalhos há desacordos, aceita, engole, é a vida; os outros fazem isso."
"Deixa de ser tão sensível, antes tu consigas engolir e trabalhar como uma profissional. O que se passa contigo?"
"Por que não consegues fazer algo simples?"
"Deram-te uma oportunidade, aceita e não te queixes. Aprenda o que tens que aprender e depois encontra outra coisa."

Entre outros pensamentos. No meio dessa confusão, decidi que não ficaria lá, mesmo que me pedissem. É uma escolha difícil porque sinto que estou a ser egoísta e estou a desiludir todos ao meu redor, mas é o meu futuro. Por que devo me preocupar com o que os outros pensam sobre isso? As consequências sou eu que tenho que arcar com elas.


Será que estou a ser uma princesa mimada?


A minha cabeça está a mil.


Mas, depois da decisão ter ficado clara na minha mente, senti-me exausta. Faltei ao trabalho porque quis. É a primeira vez que faço isto desde que entrei no mercado de trabalho... Quem sou eu? Eu, mesmo estando doente, vou trabalhar. Eu, que quando torci o pé e ele inchou, fui trabalhar. Eu, que depois de magoar o pulso e não conseguir mexê-lo, decido continuar a trabalhar em vez de ir ao médico. Quem sou eu? No que me tornei?

Talvez seja o equilíbrio que pedi ao céu, talvez seja o sinal de que comecei a colocar-me em primeiro lugar. Mas, era preciso mentir? Era preciso ligar ao médico e fingir uma doença que não tenho para poder obter um atestado? Era preciso ter feito isso tudo? No fundo, sinto vergonha; acho que cruzei uma linha da qual não poderei "voltar atrás."


Uma teoria passou agora pela minha mente: é preciso passar pelo extremo dos dois pólos para poder encontrar o equilíbrio. É preciso estar confortável com os dois extremos para podermos encontrar o equilíbrio, pois tenho consciência de que os dois lados da balança, quando pesam em demasia, não são bons.


Talvez seja isso que me distingue dos outros: a minha consciência.


S.


 
 
 

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